terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Porque é que na tradução do Antigo Testamento se usa o texto Massorético em vez da Septuaginta, que foi a versão citada pelos autores do Novo Testamento?


As razões são as seguintes:

1. Em primeiro lugar, deseja-se contar com traduções feitas diretamente do idioma em que foram escritos os livros originais. Uma tradução a partir do texto grego da Septuaginta, tratar-se-ia de uma «tradução de uma tradução», o que aumenta a probabilidade de imprecisões.

2. Os autores do Novo Testamento escreviam em grego, por isso é normal que usassem uma versão grega do Antigo Testamento quando o queriam citar, neste caso a Septuaginta a única disponível no seu tempo. Não obstante, a forma em que o texto do Antigo Testamento é citado no Novo Testamento não é uniforme (ver aqui).

3. Em terceiro lugar, não há nenhuma evidência que o texto da Septuaginta seja melhor, ou mais «puro», que o texto Massorético. Antes, pressupõe-se que o texto Massorético como uma transcrição é mais preciso do que a Septuaginta como uma tradução. Além disso,  a Septuaginta, como outras versões antigas, tem a sua própria tradição textual consideravelmente complexa.

Foi isto que levou Jerónimo no século IV a procurar a «verdade hebraica» na sua tradução.

Foi isto que levou as primeiras traduções impressas a serem baseadas nos textos gregos para o Novo Testamento e hebraico para o Antigo Testamento.

Isto é o que explica que a maior parte das traduções contemporâneas, tanto católicas como protestantes, sigam esta prática.

No entanto, isso não significa uma adesão incondicional ao texto Massorético. Apesar da sua confiabilidade geral, há indícios de que a vocalização tradicional, acrescentada aos manuscritos na Idade Média, pode refletir preconceitos doutrinais.

A prática atual é como se segue:

Se o texto Massorético e as versões antigas (com a Septuaginta à cabeça) concordam, pode pressupor-se razoavelmente que foi preservada a leitura original; isto é o que ocorre para a maior parte do texto do Antigo Testamento.

Se o texto Massorético difere das versões, deve fazer-se uma escolha com base na crítica textual.

Em passagens onde o texto Massorético é obscuro, pode recorrer-se às versões que em alguns casos esclarecem o sentido.

Se tanto o texto Massorético como as versões dão leituras pouco claras, pode ser necessária uma conjetura (muito pouco frequente).

A isto se acrescenta modernamente os manuscritos bíblicos de Qumran, que em geral confirmam a tradição textual subjacente ao texto Massorético, ainda que em algumas ocasiões diferem deste e apoiam a Septuaginta, ou diferem de ambos (em detalhes não substanciais).

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