quinta-feira, 5 de junho de 2014

Magistério infalível e niilismo filosófico


É típico da apologética católica apresentar um ceticismo epistemológico radical, argumentando que não se pode chegar ao conhecimento da verdade, a não ser através de uma autoridade infalível. Daí a necessidade da existência de uma autoridade infalível que conduza os homens à verdade.

Por exemplo, é habitual afirmarem que:

"Não se pode conhecer o cânon bíblico de modo certo e absolutamente verdadeiro, a não ser que uma autoridade infalível o determine".

"Não se pode chegar à interpretação certa e absolutamente verdadeira das Escrituras, a não ser que um intérprete infalível a forneça".

Ora, mas como todos os homens são falíveis, também não podem chegar infalivelmente ao conhecimento de uma autoridade infalível, - os católicos não podem validar infalivelmente a sua autoridade infalível, ou seja o magistério romano.

Consequentemente, os homens não teriam qualquer possibilidade de chegar ao conhecimento da verdade. Não existiriam verdades absolutas, nem nada a que pudéssemos chamar a realidade.

Este ponto de vista conduz à total desesperança, ao ceticismo mais profundo, e à insustentável posição do niilismo filosófico.

Obviamente, este ponto de vista não é para ser levado a sério, visto que parte de uma premissa falsa e filosoficamente insustentável de que os homens não podem chegar ao conhecimento da verdade sem ser infalíveis. Podemos saber muitas coisas (incluindo o cânon bíblico e o significado das Escrituras) de forma certa e absolutamente verdadeira sem ser infalíveis!!!

Na verdade, uma autoridade infalível é totalmente inútil - porque infalivelmente inalcançável - e desnecessária para que possamos chegar ao conhecimento certo e verdadeiro do que quer que seja.

5 comentários:

  1. Uma outra forma de abordar o assunto:

    http://www.reclaimingthemind.org/blog/2010/01/why-i-believe-the-canon-is-fallible-and-am-fine-with-it/

    "A suposta necessidade de um magistério infalível é uma base epistemicamente insuficiente para chegar acima do nível de conhecimento provável. Académicos católicos admitem, como têm de o fazer, que eles não têm evidência infalível de que existe um magistério de ensino infalível. Eles têm meramente o que eles mesmos acreditam ser apenas argumentos prováveis. Mas se este é o caso, então epistemicamente ou apologeticamente não há mais do que uma base provável para os católicos acreditarem que um pronunciamento supostamente infalível [seja sobre o cânon ou a interpretação do cânon] da sua igreja é verdadeiro " (Roman Catholics and Evangelicals: Agreements and Differences, p. 216).

    Conhecemos uma coisa quando há, segundo a evidência disponível, um grau elevado de certeza ou probabilidade de ser verdadeira.

    Por exemplo, podemos dizer que conhecemos que o Brasil vai organizar o mundial de futebol de 2014 porque, segundo a evidência disponível, há um elevado grau de certeza ou probabilidade de isso ser verdade, e que não estamos a sonhar ou a ter uma alucinação. Na verdade, a probabilidade de estarmos a sonhar ou a alucinar é virtualmente zero.

    Conhecimento é portanto certeza provável e não certeza infalível.

    A certeza infalível, de resto, é impossível de alcançar porque teoricamente é sempre impossível de eliminar a possibilidade de erro. Mas o facto de haver possibilidade de erro não quer dizer que ele exista.

    Por isso podemos dizer, por exemplo, que conhecemos com certeza o cânon (pela análise objectiva da evidência há uma grau elevado de probabilidade de estar certo), mas falivelmente porque não podemos pôr absolutamente de parte toda a possibilidade de erro. Mas isso não significa que a extensão do nosso cânon esteja errada. Na verdade, não há nenhuma razão para pensarmos que o está.

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  2. Muito bom o artigo, bastante esclarecedor!

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  3. Os sites de apologética católica a criar tontinhos à volta do mundo. Mais um exemplo. Ver comentários do post:

    https://triablogue.blogspot.pt/2017/05/by-what-authority.html

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  4. O PAPA E O MAGISTÉRIO INFALÍVEL DA IGREJA DE ROMA NÃO PRECISAM DE FÉ

    De fato, se Deus desse aos crentes conhecimento epistémico infalível, eles deixavam de ser imediatamente crentes, para passarem a ser detentores de um conhecimento absoluto só acessível a Deus que dispensa a fé.

    Na verdade, o conhecimento infalível exclui a possibilidade de exercer qualquer tipo de fé, uma vez que em tal conhecimento não há qualquer inferência ou qualquer passo de fé.

    Para existir fé tem de haver a possibilidade do nosso conhecimento estar errado, por mais pequena que seja a probabilidade disso ocorrer. No conhecimento infalível não há qualquer possibilidade de erro e portanto a fé é dispensada.

    No contexto cristão falar em conhecimento infalível que exclui a fé é portanto totalmente absurdo, basta pensar que somos justificados pela fé.

    É uma pressuposição necessária no cristianismo que o conhecimento seja falível - e não infalível - para que possa existir fé.

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