O SIGNIFICADO DAS PALAVRAS NEFESH E PSYCHE É AMPLO,
E EM CADA CASO DEVE DETERMINAR-SE PELO CONTEXTO
O vocábulo hebreu néfesh
e o equivalente grego psyché,
vertidos com frequência “alma” têm uma amplitude de significado que impede que
sejam traduzidos de maneira uniforme todas as vezes que aparecem na Bíblia.
Néfesh pode significar “ser vivente”, como em Génesis 2:7 e
Ezequiel 18:4. Mas também pode significar “fome”, “necessidade”, “anseio”,
“aspiração”, etc. Em Génesis 3:19 significa “alimento” e em Levítico 17:11,
“princípio vital”. A amplitude de psyché
é semelhante, e se sempre significasse “ser vivente” as seguintes passagens,
entre outras, seriam ininteligíveis:
“corpo, alma e espírito” (1 Tessalonicenses 5:23)
“palavra viva” ou eficaz (Hebreus 4:12)
“corpo e alma” (Mateus 10:28)
“as almas dos mortos” (Apocalipse 6:9)
Tanto néfesh
como psyché usam-se com frequência
para denotar o eu psicológico consciente
do homem.
Néfesh: Génesis 27:4; Êxodo 23:9; Números 24:5; Deuteronómio
4:9; Juízes 10:16; Job 10:1; 1 Samuel 4:9; 2 Crónicas 6:38; Salmos 6:3; 10:3;
42:1-5; 103:1; 123:4; Provérbios 13:9; 21:10; Eclesiastes 6:2; Isaías 10:18;
58:5-11; Jeremias 6: 8-16; Zacarias 11:8
Psyché: Mateus 10:28; 26:38; Marcos 8:36; Lucas 1:46; 12:
18-20; João 10:24; Tito 1:15; Hebreus 6:19; 8:10; 10:39; 1 Pedro 2:11;
Apocalipse 6:9-11; 18:4; 20:4.
Existe um estreito vínculo entre o conceito de “alma” (néfesh, psyché) e o de espírito
(hebraico ruach, grego pneuma). O espírito poderia descrever-se
como o princípio de vida inteligente no homem, que o faz assemelhar-se a Deus (Génesis
2:7; 1 Coríntios 2:11). De modo que o caráter pessoal do homem depende do seu espírito, mas a sua personalidade
individual e concreta constitui a sua alma. Claro está que existe certa sobreposição
entre os conceitos de alma e de espírito, ao ponto que às vezes são
identificados entre si: Êxodo 6:9; Job 7:11; Isaías 26:9.
Em honra da verdade, a Bíblia não afirma explicitamente a imortalidade da alma
humana. Na realidade diz que somente Deus é imortal em si mesmo: 1 Timóteo
1:17; 6:16; 2 Timóteo 1:10. No entanto, a Escritura ensina a continuidade da existência humana para lá do
túmulo. Na morte física, a alma se separa do corpo, e o espírito humano
sobrevive: Génesis 35:18; 1 Reis 17:22; Job 32:8; Eclesiastes 12:5-7; Salmo
31:6, Lucas 23:46; Atos 7:59; Mateus 10:28; Apocalipse 6:9; 20:4-6.
É verdade que diversos textos do Antigo Testamento, como
Eclesiastes 3:18-20 e Salmo 6:5, 115:17 indicam que os mortos são num sentido
“semelhantes às bestas” e não louvam a Deus. Mas isto é da perspetiva terrestre. Em particular, o autor de Eclesiastes indica
esta perspetiva terrenal ao perguntar: “Quem
sabe se o espírito dos filhos dos homens sobe para o alto, e o espírito do
animal baixa para o fundo da terra?”
(3:21). Mas ele mesmo responde a esta dúvida no final do livro, onde declara a
perspetiva divina: “Lembra-te do teu Criador ... antes que o pó volte à
terra, como era, e o espírito volte a Deus, que o deu” (12:1,7).
“A ignomínia final é voltar ao pó. Uma vez mais (cf.
3:20) o Pregador alude a diferentes aspectos da natureza do homem. O pó é do
que está feita a terra. A palavra enfatiza a origem terrenal da humanidade (Génesis
2:7; 3:19; Job 10:9) e a debilidade física (Salmo 103:14). Voltar para o pó é
ir em sentido contrário de Génesis 2:7 e tornar-se um cadáver, que por sua vez
é passível de mais deterioração. É não estar mais animado pelo alento que vem de
Deus (cf. Job 34:14-15). O espírito humano é o princípio de vida inteligente e
responsável. A sua retirada constitui o fim da vida terrenal e acarreta a dissolução
do corpo (cf. Salmos 22:15; 104:29). A sua volta para Deus não se desenvolve. Coloca-se,
porém, em contraste com ‘voltar para o pó’, a dissolução do corpo, e portanto
não pode referir-se a esta, porque se coloca em oposição a ela. Repete o
contraste entre ‘para cima’ e ‘para baixo’ de 3:20 e da ‘terra’ e do ‘céu’ de
5:2. O termo sugere, portanto, a continuidade da existência; mas temos de
aguardar até à luz do Novo Testamento para que sejam dados detalhes (cf. 2 Timóteo
1:10).” Michael A. Eaton,
Ecclesiastes, an Introduction and Commentary (Tyndale OT Comm. # 16. Downers Grove: InterVarsity Press, 1983, p.
150-151).
A MORTE NÃO É A SIMPLES ANIQUILAÇÃO OU CESSAÇÃO DA EXISTÊNCIA
Vários textos fazem referência aos mortos como os que “dormem”, o que implica
um estado de inconsciência em relação aos assuntos terrenais: Daniel 12:1-2;
Mateus 5:39; 27:52; João 11:11; Atos 7:60; 1 Coríntios 11:30; 15:18, 20, 51;
1 Tessalonicenses 4:13-15, etc. No entanto, a imagem também implica a transitoriedade de tal estado.
Embora os vocábulos usados em relação à morada dos
mortos, seol (hebreu) ou hades (grego) possam ocasionalmente traduzir-se no
sentido de um destino “final” e sobrepor o seu significado com o de “sepulcro”,
ocorre que tanto o hebraico como o grego possuem palavras específicas para
nomear o túmulo ou sepulcro; respetivamente kéber e mnema ou mnemeion.
O uso destas palavras é diferente do emprego de seol ou
hades. Por exemplo, há numerosas referências ao kéber ou mnema desta ou daquela
pessoa, mas nunca ao seu seol ou hades. Todos os mortos têm um sepulcro, mas
nenhum tem um seol ou hades. Num caso
se trata do túmulo ou lugar de repouso do corpo, e no outro de um lugar de
subsistência espiritual do além-túmulo.
Seol: Job 33:24; Salmo 16:10; 30:9; Amós 9:2; Isaías
14:9-15; Ezequiel 32: 21-31
Kéber: Êxodo 14:11; Números 19: 16,18; 2 Samuel 3:32;
19:37; 1 Reis 13:30; 14:13; Jeremias 8:1; 26:23
Hades: Mateus 12:40; Efésios 4:9-10; Atos 2:27
Mnema, mnemeion: Mateus 23: 39; 27: 52-53; Lucas 11:44;
João 5:28; 11:17; 12:17
Perecer não significa deixar de existir por completo. Por
exemplo, é-nos dito que o mundo antigo pereceu no dilúvio, mas certamente não foi aniquilado; de igual modo, o
atual mundo há de perecer, o que não implica o seu futuro desaparecimento, mas
a sua transformação (2 Pedro 3:6,13; Hebreus 1:11; cf. Apocalipse 21:1).
A Bíblia não se refere à morte como à simples cessação da
existência, mas antes como a uma separação.
Entre as palavras que se usam para descrevê-la há termos que sugerem fortemente
esta ideia, como o hebraico maveth
(Génesis 25:11) e o grego anairesis
(Hebreus 8:1). Sempre dentro desta noção de separação, pode considerar-se uma
morte espiritual, uma morte física e uma segunda morte. A morte espiritual foi
experimentada primeiramente por Adão quando pecou e foi expulso da presença de
Deus; nesse dia, certamente morreu (Génesis 2:16-17; cf. 3:22-24). Todo ser
humano está morto nos seus pecados, separado de Deus; mas pode passar da morte
para a vida pela fé em Jesus Cristo: Mateus 8:22; João 5:24-25; Romanos 4:17;
5:12-21; 6:13; Efésios 2:1-5; 1 Pedro 2:24. Quando Jesus declarou solenemente:
“Em verdade, em verdade vos digo que, se alguém
guardar a minha palavra, nunca verá a morte” (João
8:51) é óbvio que não se referia à morte física.
A morte física é a separação entre o corpo e a alma. Já
no Antigo Testamento se indicava que os mortos subsistiam de alguma forma, até
tal ponto que se proibia expressamente invocá-los. Na morte física a alma se separa
do corpo, mas pode voltar a este se a pessoa ressuscita. Além disso ensina-se que
os justos estarão com Deus apesar dos seus corpos se corromperem. Ver Isaías
8:19; 14:9-10; Levítico 19:31; 20:6, 27; Deuteronómio 18:10-12; Salmo 73:24-26;
Job 19:25-27.
O ensino do AT é ratificado e ampliado no NT: Mateus
27:50; Lucas 23:46; Atos 7:59; cf. 2 Coríntios 12:1-5. Tiago 2:26 diz, como
algo óbvio e conhecido por todos, que o corpo está morto sem o espírito:
“Porque assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem
obras está morta”.
A segunda morte somente é mencionada por tal nome em
Apocalipse (2:11; 20:6,14; 21:8). Novamente está implícita a ideia de separação, neste caso eterna. A segunda morte
segue-se à ressurreição física e ao juízo dos ímpios, e envolve a eterna separação
de Deus, em corpo e alma (cf. Mateus 10:28).
Para os homens, Abraão morreu (João 8:58) mas Jesus disse
que os patriarcas Abraão, Isaque e Jacob estavam vivos para Deus, que “não é
Deus de mortos, mas de vivos; porque para ele todos vivem” (Lucas 20:38).
Além das provas de caráter geral, diversos episódios
bíblicos falam da vida após a morte.
Moisés e Elias
presentes na transfiguração
Na transfiguração de Jesus, tanto Mateus como Marcos e
Lucas dão testemunho de que Moisés e Elias se apresentaram e falaram com o Senhor
(Mateus 17:3 e paralelos), o que prova que continuavam existindo. Ainda que se
argua que Elias, como Enoque, não passou pela morte física, não ocorre a mesma
coisa com Moisés (Deuteronómio 32).
O rico e Lázaro
Na narração sobre o rico e Lázaro (Lucas 16:19-31), Jesus
ensinou a persistência da consciência para lá da morte física. Nem Jesus nem
Lucas dizem ou insinuam que se trate de uma parábola. Embora o capítulo comece com
uma parábola, a qual é identificada como tal (16:1-12), depois o Senhor ensina
sobre diversos assuntos, como a impossibilidade de servir a dois senhores, o
anúncio do Evangelho, a vigência da Lei e o divórcio. A seguir, sem interrupção,
vem esta narração. Além disso, em nenhuma parábola se menciona um nome próprio,
como é o caso de Lázaro (Eleazar = Deus ajuda). Seja como for, já que as parábolas
se baseavam em acontecimentos reais ou pelo menos possíveis, muitos deles da
vida diária, mesmo se se tomar como parábola a narração isso não implica que a
narração seja uma mera ficção didática. A expressão “o seio de Abraão” é
traduzida por várias versões como simplesmente “ao lado de Abraão”, num lugar
de honra junto ao pai dos hebreus (cf. Mateus 8:11 e João 13:23). Assim Lázaro
disfruta já de tudo quanto lhe foi negado em vida, ao passo que o rico sofre no
Hades pelos seus pecados. Este é um dos ensinamentos chave da narração. O
segundo tem que ver com a incredulidade: os que não escutam Moisés e os
profetas, não acreditarão nem mesmo que ressuscitem os mortos. Esta verdade
ficou dramaticamente demonstrada com a reação dos dirigentes judeus quando Jesus
ressuscitou o outro Lázaro (João 11).
O primeiro mártir da
Igreja encomendou o seu espírito a Cristo
“Ouvindo eles [os judeus] isto, enfureciam-se em
seus corações, e rangiam os dentes contra ele. Mas Estêvão,
estando cheio do Espírito Santo, fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus,
e Jesus, que estava à direita de Deus, e disse: «Eis
que vejo os céus abertos, e o Filho do homem, que está em pé à mão direita de
Deus»... E apedrejaram a Estêvão que em
invocação dizia: «Senhor Jesus, recebe o meu espírito»” (Atos 7:54-56, 59).
Os espíritos dos
justos já estão na presença de Deus
O autor de Hebreus contrapõe o terror dos israelitas no
monte Sinai com a esperança gozosa dos cristãos, nestes termos:
“Mas vós chegastes ao monte Sião, e à cidade do Deus vivo, à Jerusalém
celestial, e à companhia de muitos milhares de anjos, à congregação dos primogénitos que estão inscritos nos
céus. Vós vos aproximastes de Deus, juiz de todos, e dos espíritos dos justos aperfeiçoados, de Jesus
mediador do novo pacto, e do sangue da aspersão, que fala melhor do que o de
Abel” (Hebreus 12:22-24).
Para o presente propósito, nos interessa o facto de que aqui “os espíritos dos justos aperfeiçoados” encontram-se
já na Jerusalém celestial, em presença do Pai, do Filho e de seus anjos. É
verdade que aguardam uma “melhor ressurreição” (Hebreus 11:35), mas já foram aperfeiçoados para estar
na presença de Deus.
“Alguns comentadores são da opinião de que estes
espíritos pertencem a crentes do Antigo Testamento; outros pensam que o
escritor se refere a santos do Novo Testamento que faleceram. Mas todos os
crentes tanto dos tempos do Antigo como do Novo Testamento, que foram
trasladados para a glória, são declarados justos. Eles foram aperfeiçoados com
base na obra de Cristo; ele é “o autor e consumador da nossa fé” (Hebreus
12:2). Qual, então, é a relação entre os santos na terra e os
santos no céu? Os santos na glória foram aperfeiçoados porque são libertos do
pecado. As suas almas são perfeitas; seus corpos aguardam o dia da
ressurreição. Em princípio, os crentes na terra compartilham a perfeição que
Cristo dá ao seu povo. Eles gozam a perspetiva de reunir-se com a assembleia
dos santos no céu. Só a morte separa a Igreja de baixo da Igreja de cima.
Quando ocorre a morte, o crente obtém o cumprimento da obra expiatória de
Cristo (Hebreus 2:10).” (Simon J. Kistemaker, Exposition
of the Epistle to the Hebrews. NT Commentary. Grand
Rapids: Baker Book House, 1984, p. 394-395).
João viu as almas dos que morreram em Cristo
No Apocalipse, João descreve a seguinte visão:
“Quando o Cordeiro abriu o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos que haviam sido mortos
por causa da palavra de Deus e do testemunho que haviam mantido; e clamavam
com grande voz, dizendo: Até quando, ó Senhor, santo e verdadeiro, esperarás
para julgar e vingar o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? E foram dadas a cada um compridas vestes brancas e foi-lhes dito que
repousassem ainda um pouco de tempo, até que também se completasse o número de
seus conservos e seus irmãos, que haviam de ser mortos como eles foram” (6:9-11).
Aqui as almas dos mortos não só estão conscientes, como clamam a Deus.
Paulo declara que
daremos conta do que fizemos “no corpo”
Em 2 Coríntios 5:1-9 Paulo declara:
“Porque sabemos que se a tenda terrenal que é a nossa
morada, for destruída, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos,
eterna, nos céus. Pois na verdade, nesta morada gememos, desejando
ser revestidos com a nossa habitação celestial; e uma vez vestidos, não seremos
achados nus. Porque também nós, os que estamos nesta tenda, gememos
sobrecarregados; pois não queremos ser despidos, mas vestidos, para que o
mortal seja absorvido pela vida. E quem para isto mesmo nos preparou foi Deus,
o qual nos deu o Espírito como garantia. Portanto
estamos sempre de bom ânimo, sabendo que, enquanto habitamos no corpo, estamos
ausentes do Senhor (porque andamos por fé, não por vista); mas temos confiança
e preferimos antes estar ausentes do corpo e habitar com o Senhor. Por isso,
quer presentes, quer ausentes, desejamos ser-lhe agradáveis”.
Aqui Paulo fala do corpo como de uma morada, e
definidamente fala da possibilidade de estar presentes perante o Senhor “ausentes
do corpo”. A seguir acrescenta que todos seremos julgados por Cristo para dar
conta do que fizemos “por meio do corpo” (v. 10). Tudo isto indica a
persistência da personalidade para lá da morte física.
No mesmo sentido, embora de maneira transitória, a separação entre o material e
o imaterial do homem está implícita quando fala da sua própria experiência: “Conheço um homem em Cristo que há catorze anos (não sei se no corpo, não
sei se fora do corpo, Deus o sabe) foi arrebatado ao terceiro céu.” (2 Coríntios 12:2).
Jesus anunciou ao
ladrão que estaria com ele no paraíso nesse mesmo dia
Em Lucas 23:42-43 lemos:
“E dizia a Jesus: Lembra-te de mim quando vieres
no teu reino. E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo hoje estarás comigo no Paraíso.” (tradução literal)
Há quem interpreta esta resposta de Jesus como uma promessa
para o futuro remoto: “Em verdade te digo hoje, [que] estarás comigo
no paraíso”, em lugar de “em verdade te digo [que] hoje estarás comigo no paraíso”. No segundo caso, toma-se
o “hoje” como indicativo de quando ocorreria o prometido; no primeiro toma-se o
hoje como uma palavra destinada a dar ênfase à declaração. Para apoiar esta
última posição, arguem-se textos, geralmente do Antigo Testamento, onde “hoje”
se usa deste modo. Mas eis aqui os factos:
1. A palavra “hoje” (grego sëmeron) aparece outras quarenta vezes no Novo Testamento fora
desta passagem, e em todos os casos se refere ao tempo presente; por exemplo,
Mateus 6:11; 21:28; Lucas 19:5,9; Atos 24:21; Romanos 11:28; Hebreus 3:15,
etc. Em Atos 20:26 pode ser enfático, mas não descarta o presente e a
construção é diferente.
2. Nos evangelhos há um total de 76 ocasiões, incluído
Lucas 23:43, nas quais Jesus usa a expressão “Em verdade vos [ou te] digo”, ou
“Em verdade, em verdade vos [ou te] digo”. Deve notar-se que a expressão “em
verdade” (grego amen) é em si enfática
e não precisa de ser sublinhada adicionalmente. Além disso, nunca em nenhum dos
75 casos fora de Lucas 23:43 Jesus acopla um “hoje” aos seus “Em verdade vos digo”,
para dar-lhe ênfase. Ou seja, para apoiar a reinterpretação de Lucas 23:43 como
enfático teria que admitir-se que somente aqui, nesta única ocasião em todos os
Evangelhos, Jesus decidiu usá-lo desse modo.
3. Há, porém, uma ocasião em que Jesus acopla o “hoje” a
um “Em verdade”; e neste único caso em particular, a referência é inequivocamente
a algo que haveria de ocorrer nesse mesmo dia: “Em verdade te digo que hoje, nesta noite, antes que o galo cante duas
vezes, três vezes me negarás” (Marcos 14:30).
Por conseguinte, toda a evidência indica que a
interpretação tradicional, “hoje estarás comigo no paraíso” é a correta.
O SENHOR JESUS ANUNCIOU A RESSURREIÇÃO DO SEU CORPO
Em Mateus 12:40 Jesus declarou: “Mas ele lhes
respondeu, e disse: Uma geração má e adúltera pede um sinal, porém, não se lhe
dará outro sinal senão o do profeta Jonas; pois, como Jonas esteve três dias e três noites no ventre do monstro
marinho, assim estará o Filho do homem três dias e três noites no coração da
terra”. Visto que a comparação se refere ao
período entre a morte e a ressurreição, deve notar-se que Jonas conservou a consciência
enquanto estava no seio do monstro; de modo que dificilmente tal permanência
indica a cessação completa da existência, ou um estado de inconsciência. Outros
textos nos indicam que com esta declaração Jesus se referia ao seu corpo, não a
todo o seu ser.
Quando Jesus expulsou os comerciantes do templo, os
judeus lhe perguntaram que sinal podia dar para respaldar o seu proceder.
“Jesus respondeu, e disse-lhes: Destrui este templo, e em três dias o
levantarei. Disseram, pois, os judeus:
Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três
dias? Mas ele falava do templo do seu corpo. Quando, pois, ressuscitou dentre os mortos, os seus discípulos lembraram-se
de que lhes dissera isto; e creram na Escritura, e na palavra que Jesus tinha
dito".
Em outras palavras, Jesus anunciou a sua ressurreição
física, corporal, “do templo do seu corpo” (tou
naou tou sömatos autou). De igual modo, em Pentecostes o apóstolo Pedro se
referiu à ressurreição física do Senhor, cuja carne (sarx) não sofreu corrupção. O que fica sem vida e se corrompe
depois da morte física é o corpo, não a pessoa na sua totalidade: João
19:31,38; Marcos 15:43-46; Lucas 23:55; 24:3; Tiago 2:26.
OS APÓSTOLOS PAULO E PEDRO FALARAM DA SUA MORTE PRÓXIMA COMO DE UMA PARTIDA
Filipenses 1:23-24, “Tenho o
desejo de partir e estar com Cristo, porque isto é muito melhor; mas ficar
na carne é mais necessário por causa de vós”.
2 Timóteo 4:6, “Porque
eu já estou prestes a ser oferecido em sacrifício, e o tempo da minha partida
chegou”.
2 Pedro 1:14-15, “brevemente
tenho que deixar o meu tabernáculo... procurarei
com empenho que, depois da minha partida, vós possais ter memória destas coisas”.
Pedro refere-se ao seu corpo como uma habitação precária,
“o meu tabernáculo” (tou skënömatos mou)
e à sua morte como uma partida (grego exodos).
Paulo usa as expressões “partir” (grego analuö)
e “partida” (grego analusis) para
referir-se à sua morte. Contrasta a sua ansiada partida com o “ficar na carne”
(epimenein tei sarki); descreve a sua
futura situação com Cristo como “muito melhor” e afirma que para ele “morrer é
ganho” (to apothanein kerdos). Estas
declarações mostram sem disputa possível que ambos os apóstolos consideravam a
sua própria morte não como um estado de inconsciência ou inexistência, mas como
uma desejada partida para estar com Cristo.
Em outro lado Paulo, inspirado pelo Espírito Santo,
declarou solenemente que nem a morte pode separar os crentes do amor de Deus
manifestado em Cristo Jesus (Romanos 8:38).
Concluímos pois que as Sagradas Escrituras ensinam a sobrevivência
à morte física do eu imaterial do homem, denominado alma ou espírito em
diferentes textos. Portanto, os que morrem em Cristo passam de imediato ao
âmbito celestial enquanto aguardam a ressurreição dos seus corpos.